Drubscky disse o que todos sabiam

E Ricardo Drubscky falou em público o que muitos não puderam.

E só o fez porque não contava que a imprensa de Goiás, na contramão do que fizeram até aqui os veículos oficiais, fosse tão firme ao inquerir-lo sobre a pré-temporada inédita do Atlético, abrindo mão de jogar o Paranaense para fazer alguns amistosos, mantendo o time inativo desde 24 de novembro em jogos oficiais: “Essas questões de a gente ficar sem jogos, a gente não vai entrar nesse mérito. É decisão da diretoria do clube, é política, e a gente ficou. Se eu não quisesse não tinha ficado. Em função disso, e aí eu posso dizer, há realmente uma perda e estamos tentando reparar com amistosos, torneios. Não é a mesma coisa, mas a gente está tentando.”

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Se Drubscky não falasse, os resultados falariam por ele. As derrotas por 1-3 para o Goiás (que, atuou só no primeiro tempo com os titulares) e 1-2 para os reservas do Atlético-GO mostraram que, mesmo pra quem despreza o Estadual, a inatividade pode custar caro ao clube. As derrotas foram para equipes do mesmo porte do Atlético, que não sabe como irá sair em um jogo pra valer. Luiz Felipe Scolari, técnico da Seleção Brasileira campeão do Mundo em 2002, exaltou o calendário competitivo do Brasil em 2013, com a Copa das Confederações no meio do ano, “por ter jogos para valer”. Jogador, quer jogar.

  • Planejamento em xeque

E a Copa das Confederações será mais um período de pausa para um ano de poucas atividades para o elenco principal do Atlético. Talvez esquecida no planejamento, a competição-teste da Fifa irá paralisar o calendário brasileiro por mais 23 dias entre 09 de junho e 03 de julho. Para o Furacão, 2013 terá exatos 123 dias sem jogos profissionais. A renúncia aos jogos, em nome de um título mundial prometido pela atual diretoria em campanha, permite uma comparação: o Barcelona, clube que vem apresentando o melhor futebol do Mundo há pelo menos 4 temporadas, tem quanto tempo de atividade anual?

A resposta deve levar em consideração o desencontro entre os calendários europeu e sul-americano. Com o verão em junho e julho, os europeus paralisam as competições, enquanto isso acontece no Brasil entre dezembro e janeiro – e em menos tempo. Os Estaduais ocupam um espaço precioso do calendário – até aí, pouco se discute sobre uma reformulação  geral e o Atlético, assim como o Grêmio, tomou uma decisão própria, ao relegar a disputa caseira ao segundo plano. No entanto, o Tricolor Gaúcho tem a Taça Libertadores no calendário, o que já o colocou em atividade.

O Barcelona venceu a Copa do Rey sobre o Athletic Bilbao por 3-0 em 25 de maio de 2012. Depois, deu férias aos seus jogadores e retomou as atividades em julho, fazendo seu primeiro jogo na nova temporada em 24 de julho, um amistoso contra o Hamburgo. Foram 60 dias sem jogos. O primeiro jogo oficial aconteceu apenas em 19 de agosto, vitória por 5-1 sobre a Real Sociedad – portanto, 85 dias depois do último jogo. Se seguisse o planejamento do Barcelona, o Atlético, que enfrentou o Paraná em 24 de novembro de 2012 no Derby (1-1) da última rodada da Série B, entraria em campo com o time principal em 17 de fevereiro – a 9a rodada do Paranaense aconteceu em 16/02, com o Sub-23 atleticano vencendo o J. Malucelli por 3-1. Na semana seguinte, foi jogado o Atletiba #353.

A temporada européia começa com um primeiro mês com 4 jogos oficiais. O Barça ainda arrumou datas para 4 amistosos. Em agosto de 2012, venceu Real Sociedad e Osasuña pela Liga, perdeu o título da Supercopa da Espanha em dois duelos com o Real Madrid (3-2 e 1-2, vice no gol qualificado) e fez amistosos com PSG (2-2), Manchester United (0-0), Dínamo Bucareste (2-0) e Sampdoria (0-1). No período equivalente, o Atlético fez 10 jogos. Fevereiro reservou 6 jogos oficiais (2-1 Cianorte, 0-0 ACP, 0-2 Londrina, 1-1 Arapongas, 3-1 J. Malucelli e 1-2 Coritiba) e 5 amistosos, com a conquista da Marbella Cup sobre Ludogorets Razgrad (6-2), Dínamo de Kiev (1-0) e Dínamo Bucareste (1-0) e mais a derrota por 1-3 para o Cluj e o empate em 1-1 com o Otelul Galati.

Durante o período de inatividade do elenco principal, além dos adversários goianos, o Atlético enfrentou mais dois adversários interestaduais: Joinville e Figueirense, ambos atuando com o time reserva. O Furacão venceu os dois jogos, 3-0 e 3-1. O clube tentou amistosos na Argentina, Uruguai e Chile, mas todos os clubes procurados deram prioridade aos seus calendários oficiais.

O desempenho do Atlético no Estadual e nos amistosos no Brasil, as reclamações dos jogadores pedindo mais jogos e um comparativo com o melhor modelo de planejamento de futebol do Mundo deixam a pergunta: o Atlético, mesmo politicamente abrindo mão do campeonato mais possível de se conquistar, age bem em pensar só na política?

Quebra de paradigma

O anúncio pegou a todos de surpresa: o Atlético irá disputar, entre 1 e 12 de fevereiro, um torneio na Espanha, participando da intertemporada européia, confirmando a estratégia de deixar o time Sub-23, que está em preparação desde o ano passado, no primeiro turno do Paranaense. Assim, quebra um paradigma no futebol brasileiro e estica a própria pré-temporada, adaptando-se a um calendário inchado e muito criticado no Brasil.

No papel, a ideia é ótima. Na prática, só o tempo dirá. Evidentemente, como as últimas temporadas já mostraram, não basta apenas estrutura e boa estratégia para que um time seja vencedor. Estrutura o Atlético tem de sobra; o que tem faltado mesmo, há algum tempo, é material humano. Mas o clube não deu prioridade ao investimento pesado em jogadores nesta temporada – tampouco admitiu estar pressionado pelas contratações dos rivais, em especial o Coritiba, como me disse o diretor de futebol Antônio Lopes nessa entrevista (clique para assistir).

Já que não abriu os cofres – e nem tem poder para competir no mercado com Corinthians, Santos e outros – optou por um intercâmbio europeu, tirando os jogadores do elenco principal do excesso de jogos, dando experiência ao grupo numa disputa com estilos diferentes de jogo, proporcionando integração no elenco e uma experiência de vida individual que pode sim ser revertida em desempenho. Funcionário feliz é funcionário produtivo, em qualquer segmento. E conhecer a Espanha nunca foi mau negócio.

O que pode dar errado é justamente o choque cultural. Primeiro, fora de campo. O elenco Sub-23 tem jogadores conhecidos que já tiveram suas chances e outros que ainda são apostas. O volante Foguinho e o lateral Herácles, por exemplo, são os mais experientes, ao lado de Zezinho, que apareceu bem no Juventude, mas desde uma passagem pelo Santos não decolou na carreira. O goleiro Santos e o trio de atacantes Taiberson, Edigar Junio (sem “r” mesmo) e Pablo são apostas.

Diante de um Coritiba soberano no Estado e com o melhor elenco entre todos os paranaenses, um Paraná sedento por uma resposta ao torcedor, com aposta num elenco mais experiente, e os sempre competitivos Londrina, Operário, Arapongas e Cianorte, os meninos do Atlético podem sofrer uma pressão por resultados que atrapalhe ou antecipe a entrada do time principal na disputa. A aprovação à ideia dura até o primeiro 0-3 contra, como de praxe no futebol.

Em segundo lugar, pode haver uma distância muito grande entre a preparação internacional do Atlético para a de outros clubes brasileiros. Esse é o menor risco, de fato. Mas a dinâmica de jogo que o clube precisa ter na Copa do Brasil e no Brasileirão pode ser maior do que a oferecida pelos adversários na excursão. Os times do Leste Europeu estão na segunda linha do futebol daquele continente. Adversários interessantes que podem estar no caminho atleticano são o Dínamo de Kiev, da Ucrânia (que disputou a Champions League na fase de grupos e pegará o Bordeaux, da França, na fase de 1/16 avos da Liga Europa) e o Rubin Kazan, da Russia (que também está na Liga Europa e será o adversário do atual campeão, Atlético de Madrid). Ambos fizeram a decisão do mesmo torneio na última temporada – na foto do post, lance da partida, vencida pelo Rubin por 2-1.

No geral, a ida para a Europa em meio ao Estadual (que, diga-se, não está sendo “abandonado” pelo clube, que estará na disputa) pode significar um marco no futebol brasileiro. O desempenho do Atlético nas competições nacionais poderá ser parâmetro para outros clubes, caso a ideia seja bem-sucedida. Nem tanto pela viagem à Europa, mas muito mais por uma pré-temporada de 40 dias na prática, criada por iniciativa própria. No papel, parece bom. Na prática, só esperando os resultados.